Paulo Brazil, nascido em 24 de maio de 1982, em Salvador, Bahia, é reconhecido como um dos principais cronistas e pesquisadores da cultura Hip Hop no Brasil. Apelidado de “arqueólogo do Hip Hop baiano e nacional”, ele construiu uma trajetória marcada pelo compromisso de registrar, preservar e difundir a memória do movimento.
Desde o final dos anos 90, quando ainda era adolescente, Paulo já compreendia que o Hip Hop precisava ser documentado. Em uma época em que a informação era escassa e fragmentada, ele percebia o risco de que os pioneiros daquela “golden era” caíssem no esquecimento. Sua preocupação era clara: criar pontes entre as gerações e impedir que as histórias se perdessem no tempo.
Inspirado em iniciativas como a de Jorge Hilton, que publicava zines culturais, Paulo começou a reproduzir e distribuir esse tipo de material em Salvador. Levava os zines para o trabalho, fazia cópias após o expediente e espalhava a palavra em diferentes pontos da cidade. Nos picos de skate de Pituaçu, no Pelourinho, na Lapa e em outros espaços de encontro da juventude, ele entregava exemplares a quem quisesse conhecer mais sobre rap, música alternativa e produção cultural underground. Para ele, aquilo era “dar a letra”: oferecer conhecimento e fortalecer o movimento.
Paralelamente à circulação de informação, Paulo também se tornou organizador de eventos de rap na capital baiana. Em uma época em que fazer Hip Hop na Bahia exigia improviso, criatividade e paixão, ele ajudou a construir uma cena vibrante, mesmo sem recursos. Shows eram montados com caixas de som precárias, engradados de cerveja e tapetes usados como palco. O que movia tudo era o amor pelo rap e a necessidade de dar voz à periferia.
Os eventos, muitas vezes realizados de graça, se multiplicavam em diferentes bairros de Salvador, ocorrendo quase todo fim de semana. Esse movimento culminou no que Paulo chama de “marco zero” do Hip Hop organizado na cidade, momento em que a cena começou a ganhar consistência e a fortalecer coletivos como a Posse Orí, da qual ele participou desde as primeiras reuniões.
Além da militância ativa, Paulo construiu um acervo de valor inestimável: discos, livros, revistas, matérias de jornais, panfletos e flyers que registram a trajetória do Hip Hop baiano e brasileiro. Esse tesouro documental o transformou em referência nacional, a ponto de se tornar o preparador e principal fornecedor de material para o livro Assim Que É – A História do RZO (2021), de Jeff Ferreira.
Sua atuação como escritor ganhou força nos anos 2000. Paulo tornou-se colunista do blog Olha Onde a Favela Chegou, onde entrevistava artistas da cena local, captando suas visões e experiências. Mais tarde, expandiu seu alcance como colaborador de veículos especializados, como os sites Oganpazan e Submundo do Som, consolidando-se como um dos principais divulgadores da cultura Hip Hop no país.
Em 2021, Paulo deu um passo decisivo: cofundou, ao lado de Gagui IDV e Jeff Ferreira, a Editora Dando a Letra, voltada para a literatura ligada ao Hip Hop. Nesse mesmo ano, publicou seu primeiro livro, Histórias, Registros e Escritos – Contos da Quebrada Vol. I. A obra apresenta uma Salvador invisibilizada, a capital das ruas de barro e dos barracos, distante do cartão-postal turístico. Nos contos, Paulo oferece ao leitor uma narrativa crua e visceral, que ele mesmo define como uma “tag no muro da literatura”.
Em 2022, lançou Certa Feita – Prosas e Proceder no Hip Hop Soteropolitano, resultado de um trabalho iniciado uma década antes. Entre 2010 e 2011, Paulo fotografou intensamente a cena Hip Hop de Salvador, transformando seu blog em um verdadeiro estúdio de revelação. O livro reúne entrevistas com artistas, ativistas e compositores que ajudaram a construir a história do rap na Bahia, funcionando como uma viagem temporal pela memória coletiva da cena. O projeto ainda se desdobrou em uma exposição, reforçando o caráter documental e artístico de sua pesquisa.
Paulo Brazil não é apenas um pesquisador que olha para o passado: ele é um cronista que entende o presente e projeta o futuro. Sua escrita busca romper o silêncio que a grande mídia impôs ao Hip Hop baiano, revelando trajetórias de artistas e coletivos que formaram as bases da cena.
Mais do que arquivar, ele se dedica a contar histórias, conectando gerações e lembrando que a cultura Hip Hop é feita de memória, luta e continuidade. Sua obra literária e jornalística não apenas registra o que já aconteceu, mas inspira novas narrativas, novas rodas de rima, novos eventos e novos livros.
A trajetória de Paulo Brazil é, em essência, a de alguém que transformou o ofício de guardar em arte de narrar. Seu olhar arqueológico devolveu visibilidade a personagens que poderiam ter sido apagados pelo tempo, fazendo de sua vida um testemunho de que o Hip Hop, na Bahia e no Brasil, não é apenas música, mas também literatura, documento e resistência.
A História do Hip Hop Baiano por Paulo Brasil | Especial RAP071
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